terça-feira, 17 de novembro de 2009

ÁREAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE URBANIZADAS







Uma das matérias que atormenta urbanistas e ambientalistas é conciliar a preservação de APPs com a urbanização da cidade.
A matéria de fato gera dúvidas e já foi objeto de várias discussões doutrinárias.
É preciso conciliar os dois interesses da cidade, sem prejuízo ao meio ambiente e sem impedir seu desenvolvimento sustentado, possibilitando “interfaces” entre os dois ramos do direito público.
A tarefa é árdua e tão perigosa quanto caminhar em areia movediça. Mas precisa ser enfrentada.
O Código Florestal (lei federal), o Plano Diretor e o Código do Meio Ambiente (leis municipais) dispõem sobre as áreas de preservação permanente – APPs, evidenciando a preocupação com a preservação dos recursos hídricos e com a mata ciliar que deveria existir ao longo dos cursos d’água que cruzam a cidade.
Não se tem como negar que as normas de preservação ao meio ambiente estabelecidas no Código Florestal devem ser aplicadas também na zona urbana dos municípios.
Não se pode mais admitir alegações que consubstanciem a idéia de que nas cidades não existem mais florestas e, por isso, o código florestal não se aplicaria aos imóveis que compõem a malha urbana.
Não é assim.
Tanto que o Código do Meio Ambiente (LC 1616/04 – diploma legal municipal com pouco mais de 03 anos e que complementa o Plano Diretor), ao determinar quais os princípios que regem a Política Municipal do Meio Ambiente, inclui no rol a “organização e utilização adequada do solo urbano e rural...” (art. 2º, IV); ao estabelecer as normas gerais que norteiam a aplicação do código municipal refere-se à “peculiaridades dos meios urbano e rural” (art. 5º); ao disciplinar, por exemplo, sobre a gestão dos Recursos Hídricos, preceitua que deverá haver integração entre o planejamento urbano e rural do Município (art. 101, VI; e assim por diante.
O mesmo ocorre com a definição das larguras de faixas ao longo dos cursos d’água, consideradas APPs, no art. 164.
Não bastasse, o art. 168, I, refere-se, expressamente, à “Lei Florestal” (que não deve ser outra que não o denominado Código Florestal).
Portanto, em Ribeirão Preto, a questão está superada.
O Código Florestal aplica-se também aos imóveis urbanos, no que couber.
Ainda que assim não fosse, o Código Municipal do Meio Ambiente também dispõe sobre as APPs ao longo de cursos d’água, nos mesmos moldes que a lei federal, mantendo a idéia preservacionista e recuperadora dos recursos hídricos e das matas ciliares.
Se as considerações acima podem ser tidas por aplicáveis, porque razoáveis, não menos razoáveis e de necessária observância são as que se voltam ao meio urbano consolidado, ainda que, infelizmente, no passado, não se tenha priorizado a preservação do meio ambiente e nem se tenha preocupado com as futuras gerações e seu direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.
É o caso do córrego Retiro Saudoso, especialmente no trecho em que é ladeado pela Av. Francisco Junqueira.
Há décadas, o córrego foi “canalizado”, com a construção de “muros” de concreto delimitando, estreitamente, suas margens. Logo em seguida dos muros, tem-se uma balaustrada, um estreito passeio público (onde foram plantadas algumas árvores, que não se confundem com mata ciliar) e, em seguida, as pistas de asfalto da avenida, que é margeada por outro passeio público, quando se inicia o alinhamento predial dos terrenos particulares e públicos, que compõem as quadras lindeiras.
Essa, infelizmente, é a realidade urbana do local .
Não se tem como olvidar que o Poder Público, ao construir uma avenida que estrangula o córrego em questão e que impermeabiliza o solo no seu entorno tornou impossível, nos dias de hoje, a recuperação da mata ciliar que deveria cobrir a área de várzea.
Além do asfalto que margeia o córrego, quase todos os terrenos situados ao longo da Av. Francisco Junqueira (entre a Rotatória Amim Calil e a Av. Costábile Romano) estão edificados, sem nenhuma limitação ou restrição de uso referente à faixa de APP.
A preservação do curso d’água e da mata que deveria cobrir suas margens está definitivamente prejudicada. A obra pública e a ocupação irrestrita dos imóveis particulares aniquilaram a destinação da faixa de APP do córrego Retiro Saudoso, ao menos neste trecho.
Não obstante isso, ainda é tempo de impedir a impermeabilização excessiva do solo na região e, por conseqüência, reduzir os perigos de enchentes à jusante, ou seja, mitigar o impacto causado pela urbanização sem planejamento e sem preocupação de preservar os recursos naturais, evitando aumento do escoamento das águas superficiais e assoreamento do curso d’água causado pelos lançamento de detritos nas vias públicas, bem como mantendo áreas de infiltração, embora permitindo a ocupação dos terrenos particulares por construções.
É do que cuidou o Código Municipal de Obras (LC 2158/07), ao dispor sobre “captação pluvial”, nos arts. 231 a 237.
Posto isso, parece-nos razoável permitir a ocupação dos terrenos urbanos ao de APPs urbanizadas, desde que sejam cumpridas as exigências e restrições impostas pelo Código de Obras, quando nele se for construir. Haverá também de ser observadas as normas relativas ao uso e ocupação do solo (LC 2157/07) e as normas ambientais aplicáveis ao caso.
De outro lado, é bom ressaltar que, ainda que as intervenções nas APPs sejam de baixo impacto, deverão ser objeto de licenciamento ambiental, conforme resoluções do CONAMA adotadas pelo órgão ambiental municipal.

6 comentários:

  1. Maria Helena, gostaria de parabenizá-la pela atitude corajosa de elaborar este blog, sobre áreas de presevação em zonas urbanas e espero que o seu blog seja "referencia" para nossos urbanistas, corretores de imoveis, proprietarios, construtores e todas as pessoas que tem interesses no desenvolvimento "sustentavel" de suas cidades! Espero que o assunto não se esgote e que novas experiencias você apresente aqui para o publico interessado!!!! Parabéns pela importante iniciativa!!!

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  2. Agradeço muito o comentário. Sou uma apaixonada pelo direito urbanístico e, de vez em quando, atrevo-me a rabiscar alguma coisa a respeito. fico feliz de alguém ter gostado.

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  3. Maria Helena, vc. mora em Sao Paulo, deve ter uma bagagem enorme sobre direito ambiental. Eu faço parte do Conselho de Meio Ambiente de minha cidade, estamos organizando com pessoas da sociedade, Grupo de 3 Setor, para acompanhar, discutir, propor ideias para o desenvolvimento sustentavel da cidade. Gostaria de sua participação, se possivel, na comunidade Orkut de minha cidade. A sua presença nas discussões seria-nos de grande valia. O link da comunidade é
    http://www.orkut.com.br/Main#Community?cmm=131908

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  4. Obrigada, mais uma vez. Já solicitei minh a participação na comunidade de S J Pinhais. Vejam só: morar em São Paulo não é a melhor referência sobre meio ambiente, até porque nosso estado é um dos mais devastados do país. Nosso desenvolvimento cuidou de "desbravar" nossas florestas e as transformou em cidades e/ou plantação de cana (com muita queimada)

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  5. Parabéns pelo blog Maria Helena.

    Abraço!

    Luis

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